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11 de Dezembro de 2012 - 17:15

O Prejuízo Fiscal e Social da Recuperação Judicial Fraudulenta

 

A geração de riquezas, quase que indiscutivelmente, depende do desenvolvimento de atividades empreendedoras. Com o passar do tempo, para fomentar tais atividades, criou-se a ficção jurídica da empresa, uma “pessoa” conceitual, individualizada das físicas que a formam, beneficiada com uma série de outras figuras jurídicas destinadas a propiciar-lhe o crescimento e, em conseqüência, pelo menos teórica, o da comunidade envolvida.

No campo dos tributos, tal intuito de fomento fica claro quando comparamos a tributação da atividade empreendedora desenvolvida por um profissional autônomo, tributado como pessoa física que é, em contrapartida à da atividade desenvolvida por uma empresa, ainda que formada por um único proprietário, mas formatada como uma “pessoa jurídica”, que pode crescer, empregar outras pessoas e gerar mais riquezas.

É o desenvolvimento da atividade comercial que gera a tributação, no entanto, a natureza jurídica da “pessoa” tributada gera diferenças impossíveis de ignorar. Daí a quase unânime idéia de que é melhor formar uma “PJ” quando se fala em incidência tributária. Sob um olhar social esse planejamento tributário é bem visto, na medida em que tira esse profissional da informalidade e o coloca dentre os efetivos geradores de riqueza que não a própria.

A empresa sofre alíquotas menores, ganha benefícios fiscais envolvidos na aplicação da empresa em projetos de fundo social, mecanismos de fomento e até de financiamento da própria carga tributária, como o Produzir e o Fomentar em nosso Estado de Goiás, emprega outras pessoas, alcança mais consumidores e, em retroalimentação, gera mais tributos. Essa é a ideia.

O problema é o desvirtuamento da ideia. E o foco deste artigo é o desvirtuamento da pessoa jurídica em dificuldades financeiras, através do uso fraudulento do instituto da Recuperação Judicial.

O intuito da Recuperação Judicial é a preservação da empresa, ajudando na superação da situação de crise econômico-financeira, a fim de ser mantida a fonte produtora e atendido, na medida do possível, o interesse dos credores.[1]

Mas, poder-se-ia estar indagando, o que isto tem a ver com o Fisco, já que a negociação com os credores não alcança os débitos tributários.

Isso significa dizer, em primeiro, que as Execuções Fiscais não são afetadas em seu curso, nem a exigibilidade dos créditos tributários e, em segundo, que a Fazenda Pública não tem autoridade para negociar seus créditos, como os demais credores, na medida em que sua atividade arrecadatória é plenamente vinculada, ainda que algumas medidas legais estejam sendo adotadas para mitigar esse “engessamento”, mas não trataremos disso neste artigo.

No entanto, a satisfação efetiva do crédito tributário se submete inteiramente à Recuperação Judicial, já que os atos que comprometem o patrimônio da empresa, são exclusivos do juízo da RJ, ainda que já penhorados em Execução Fiscal.[2]

A primeira obrigação deixada de lado na situação de dificuldade financeira é a tributária. Os valores costumam ser significativos e o credor não telefona nem fica batendo à porta. È possível postergar o problema, para a grande maioria dos empresários.

No entanto, isso significa a perda de arrecadação, a concorrência desleal com os que continuam pagando seus tributos e gera uma dívida cada vez maior, enfrentando SELIC e multas de 20 a 150%, muitas vezes inviabilizando a recuperação financeira da empresa. É um prejuízo social enorme em qualquer situação.

Quando a sonegação decorre de fraude, e, no caso da RJ é ainda pior, já que os fraudadores se utilizam de chancela do próprio poder público, o prejuízo é maior. É moral. É da nação.

A implantação efetiva de uma Recuperação Judicial significa que a Fazenda irá parcelar seus créditos. Isso é garantido pela modificação realizada no CTN, art.155-A, pela Lei Complementar nº 118, e condição necessária após a aprovação do plano de recuperação, que se exige a apresentação das certidões negativas de débitos fiscais.

Assim, hoje, a empresa em recuperação judicial interfere diretamente na esfera da Fazenda Pública que, obviamente, irá conceder moratória à pessoa jurídica em sua luta para permanecer em atividade, mantendo-se a unidade geradora de riquezas.

Quando se trata de recuperação judicial fraudulenta, isso significa que os criminosos responsáveis irão se locupletar também da Fazenda Pública e isso é inconcebível. Além de todas as conseqüências danosas já enumeradas, passam a ter condições especiais de parcelamento, perdão de multas, dilação em anos para pagamento, jogando ao chão, de vez, a equidade e a justiça fiscais.

E, ainda assim, se as Execuções Fiscais prosseguirem, nos casos em que a exigibilidade do crédito se encontrar suspensa por discussão amparada por penhora, diversas são as situações a ser consideradas antes que o Fisco veja sua parte do dinheiro arrecadado com os bens penhorados, já que os leilões ficam impedidos e os valores já arrecadados são divididos entre os créditos que ainda preferirem ao tributário. Sem contar que a fraude pode até se estender à arrematação dos bens por pessoas envolvidas no esquema.

Sob qualquer ângulo, a fraude praticada na Recuperação Judicial é caso gravíssimo e deve ser combatida com unhas e dentes por nossa sociedade, em especial o poder público, com todas as armas ao seu dispor, porque as suas conseqüências levam à morte dos princípios, da igualdade e da justiça. Mas sob o ângulo fiscal, a fraude leva à morte de diversas outras pessoas. Seja outras pessoas jurídicas que não conseguem competir com a deslealdade, seja de pessoas físicas, reais, sem acesso aos serviços básicos porque o Estado não arrecada o que deveria.



[1] Art.47, Lei n. 1.101/2005 - LRJ

 


[2] Arts.47 e 83, LRJ e art.5º, Lei n. 6830/80 -LEF

AUTORA: Denise de Holanda Freitas Pinheiro